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quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Corporação, reloaded

A pedido do Pachá, vou tentar desenvolver um pouco mais um tema que eu havia pensado há três dias. De fato, é mais um desabafo de alguém que estuda em uma escola de Administração que propriamente uma análise ultra-profunda sobre o tema, mas tem valor também.

Havia comentado que em Metropolis, a fantástica obra do Fritz Lang (1927), uma jornada considerada cansativa pelo Freder tinha 10 horas de duração. Tema que será revisitado no igualmente clássico Tempos Modernos, de Chaplin, acho que de 1936 (ou por aí), de um modo hilário e sério, que só alguém do porte do Chaplin saberia fazer.

Na análise de Andreas Huyssen (1982) sobre Metropolis, comenta que há uma visão dupla em relação à tecnologia: algo que pode ser tanto positivo para a sociedade quanto algo que pode ser muito ruim. Basta lembrar todo aquele furor da Belle Époque, com as idéias dos carros voadores e das máquinas que permitiriam ao indivíduo ter mais tempo para as artes, família, etc. Tudo isso devidamente interrompido pela Primeira Guerra Mundial, em que ocorreu o oposto: a tecnologia foi pesadamente usada para destruir, matar, torturar, enfim, acabar com o ser humano. Portanto, nada surpreendente Metropolis apresentar essa postura.

Com as novas mídias do século XX, a situação não foi bem assim, tão "flores".

O telefone, embora inventado no século anterior, teve sua massa crítica atingida no séc. XX, aumentando a capacidade de comunicação (no modelo 1/1). O rádio, idem ao telefone, só que no modelo 1/N. Televisão, a mídia de massa com imagens, solidificou o modelo de difusão 1/N.

Não é de se espantar que, com a alteração na dinâmica das cidades (e aqui, principalmente, as dos EUA), espalhando-se para os subúrbios (mudança possibilitada pelos carros agora mais baratos), acaba-se gerando um isolamento cada vez maior dentro da própria casa. O rádio e a televisão servem como fonte primária de notícias, atualizadas em "tempo real" (ao contrário do tradicional jornal impresso, com um delay típico de 1 dia).

Esse modelo de "isolamento" tem suas vantagens, ao obrigar uma separação entre o espaço do trabalho e o doméstico.

Com a telefonia móvel (final de 1970 e início de 1980), somada às tecnologias ligadas à informática, a década de 1980 experimenta o início de uma alteração na idéia de trabalho, abrindo a possibilidade de extensão da jornada de trabalho para o ambiente doméstico.

A década de 1990 marca a consolidação desse processo, com a supremacia do uso corporativo do e-mail e a disseminação do computador pessoal. Ou seja, agora você tem a possibilidade de, no conforto do seu lar, trabalhar em frente ao computador e enviar, sábados, domingos ou feriados, relatórios, análises, etc.

Com a maldição do Blackberry (e posteriores smartphones), caiu a barreira entre o trabalho e a residência. Tudo é trabalho ou, como adorariam os meus amigos adoradores do Spinoza, em potência.

Se em Metropolis eram 10 horas diárias, agora são até 12 ou 13, no escritório, além das restantes, pois é necessário que você esteja de stand by, com seu celular ligado ao lado de sua cama, para a eventualidade de alguém ligar.

O suporte para esta prática foi construído, ao longo do tempo, pelo discurso gerencial. Frases como "os mais fortes sobrevivem no mercado", "você tem que ser pró-ativo", "tem que ser criativo", dentre várias outras comuns no dia-a-dia do RH e da literatura gerencial de livraria de aeroporto são a dimensão perceptível de algo muito mais assombroso, já cantado pelos nossos colegas Foucault, Deleuze, Guattari, Negri, etc: a biopolítica (junto com o conceito de biopoder).

Vale lembrar que as técnicas agem de tal modo que você acaba acreditando na sua validade, na suposta imanência, sem sequer se pensar no motivo, na razão, na ideologia por trás de tudo (e sempre há uma ideologia por trás).

Interessante, percebi agora que há uma coisa coincidente: enquanto as técnicas agem sobre o "corpo e a alma", o que significa uma corporação? Do latim, corporis.

Bem-vindo a este mundo de permanente vigília. De liberdade vigiada; principalmente por você mesmo.

Um comentário:

  1. Obrigado por atender ao pedido de bate-pronto e parabéns pelo post.
    Realmente agora não há mais hora para nada e a vigilância está presente o tempo todo. Eu como free-lancer tenho meu celular ligado 24 horas por dia caso algum trabalho precise de mim. O mundo está, sem que nos demos conta, se tornando algo entre "Vigiar e Punir", de Foucault e "1984", de Orwell.
    E nos EUA desde 2001 estão sendo aprovadas leis que acabam completamente com a privacidade do indivíduo. Tudo "em nome da segurança". Como é lucrativo esse lance de insegurança... Mas aí já é outro post...
    Abraços!

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